Existem temas na Igreja que exigem uma boa dose de delicadeza, reverência e coragem. Entre eles, está a realidade dos homens e mulheres que, mesmo tendo contraído um matrimônio sacramental válido, experimentam a dor da separação, e ainda assim escolhem permanecer fiéis.
Essas histórias quase sempre são vividas escondidas, envoltas em incompreensão. Muitos olham apenas para o aspecto jurídico; outros caem no moralismo. Poucos enxergam a pessoa concreta, com seus medos, sua cruz, sua esperança e seu chamado a santidade.
É exatamente nesse território sensível e profundamente humano que se insere o livro A Fidelidade Matrimonial em Estado de Separação, de Marcelo Fiães. A obra do doutor em teologia pelo Instituto João Paulo II de Roma, apresenta uma visão que equilibra sensibilidade pastoral e teologia, para atender às realidades com fidelidade ao magistério. Compreende um estudo profundo, fruto de estudo, oração, escuta pastoral, e convivência com fiéis que sustentam, quase sozinhos, o peso da fidelidade matrimonial em estado de separação.
A fidelidade matrimonial em estado de separação é um livro essencial em nossos tempos
Vivemos na cultura dos vínculos frágeis. Tudo se troca, tudo se rompe, tudo se substitui com rapidez e sem discernimento. O matrimônio, muitas vezes, se transforma em contrato, e quando o amor é ferido, muitos acreditam que a única saída é recomeçar com outra pessoa. Vemos isso na nossa experiência com vasto trabalho de preparação matrimonial, tema que nosso instituto e editora possuem a graça de atuar de forma intensa. Assim, podemos dizer que, nos dias de hoje, enquanto muitos criam “soluções protocolares” de preparação para o matrimônio, de poucos dias ou poucas semanas, onde não se oferece um adequado processo de discernimento, também nos falta a calma e os critérios para um discernimento diante das duras realidades de necessidade de separação de corpos ou abandono. Parece que vivemos uma sociedade que vive uma carência de processos adequados, paciência e rigor adequado em todos os momentos, seja na hora do discernimento para casar, para “descasar” e para “recasar”.
Nesse cenário, a fidelidade matrimonial em estado de separação parece absurda. Parece dureza ou até crueldade. Mas a Igreja, sempre fiel ao Evangelho, sabe que há uma luz enorme escondida nessa fidelidade silenciosa. São João Paulo II, citado logo na sinopse do livro, não apenas reconhece essa realidade, como a exalta como um testemunho singular para o mundo e para os próprios cristãos.
O livro do Dr. Marcelo Fiães surge como resposta a uma necessidade real: mostrar que a fidelidade, nesses casos, não é uma imposição fria, mas uma vocação.
A fidelidade matrimonial em estado de separação é uma forma concreta de seguir Cristo, sustentado pela graça do sacramento. Não é apenas “não casar de novo”; é permanecer ancorado em Cristo Esposo, vivendo o matrimônio como mistério até mesmo na ausência física do outro.
Uma abordagem profundamente cristã
Um dos méritos da obra é o equilíbrio. Marcelo não trata o tema nem como um exercício de direito canônico, nem como um ideal moral abstrato. Ele ilumina a realidade sob uma perspectiva profundamente pastoral, mostrando que o fiel separado não é alguém que cumpre uma lei por rigidez, mas alguém que encontra em Cristo a força para permanecer.
Ao revisitar a tradição da Igreja, especialmente os Padres, ele recorda que o matrimônio, para os batizados, não é apenas uma instituição natural, mas um sacramento da redenção. Cristo não está “ao redor” do matrimônio: Ele está dentro dele. É o próprio Cristo quem sustenta o vínculo, quem dá sentido à fidelidade, quem permanece quando o cônjuge vai embora.
Essa visão muda tudo. A fidelidade matrimonial não se apoia apenas em uma norma, mas no próprio Cristo. E, por isso mesmo, o livro recoloca cada leitor diante de uma verdade grande e consoladora: o matrimônio continua vivo mesmo quando ferido.
A dor que se transforma em bênção
A experiência da separação nunca é leve. Mas o livro mostra que, na fé cristã, sofrimento não é sinônimo de infelicidade. Conforme ensina o Evangelho, o sofrimento acolhido na verdade pode se transformar em bênção, maturidade e santificação.
Marcelo descreve como muitos fiéis separados descobrem um caminho inesperado de fecundidade espiritual: aprendem a amar com mais pureza, a perdoar com mais profundidade e a esperar com mais liberdade. A fidelidade aqui não é estagnação; é transformação.
A Igreja não abandona o fiel separado
Uma das partes mais consoladoras da obra é o papel da comunidade cristã. O fiel separado não caminha sozinho. A liturgia, os sacramentos e a vida comunitária são fonte de força, amadurecimento e esperança. O livro insiste na importância da Igreja como casa que acolhe, que sustenta e que acompanha aqueles que permanecem fiéis mesmo na ausência do outro.
E lembra que essa fidelidade sempre aponta para algo maior: para a conversão do cônjuge que partiu, para a reconciliação possível, para a abertura ao perdão. Mas mesmo quando a reconciliação não acontece, a fidelidade continua sendo um caminho de santidade e plenitude.
Ao final da vida, escreve Marcelo de maneira tocante, o fiel pode apresentar-se diante de Cristo com a consciência tranquila e dizer:
“Fui fiel a Ti, Senhor, e esperei.”
E isso basta. Isso salva.
O testemunho de um autor que tem autoridade porque viveu com o povo
Marcelo Fiães escreve não apenas como teólogo, mas como esposo, missionário e amigo de tantos fiéis separados que o procuraram ao longo dos anos. Sua experiência nas Filipinas, sua formação no Instituto João Paulo II e sua atuação com casais em crise dão a este livro um peso especial: ele nasce da oração e do encontro real com o sofrimento humano.
Por isso a obra não é fria. Não é teórica. Ela respira compaixão, lucidez e verdade. Cada página traz a marca de alguém que viu o sofrimento e, ao mesmo tempo, viu a graça agindo em meio a ele.
Por que este livro é tão necessário hoje?
Porque há homens e mulheres vivendo essa realidade, em silêncio, dentro das nossas paróquias.
Porque muitos acreditam que a separação destruiu sua vocação matrimonial, e não destruiu!
Porque a fidelidade ao sacramento é possível, é santa e é profundamente fecunda.
Porque em tempos de vínculos frágeis, o testemunho de quem permanece fiel a Cristo é um farol para toda a Igreja.
O livro A Fidelidade Matrimonial em Estado de Separação devolve dignidade, missão e esperança a quem mais precisa, e assim, ajuda toda a Igreja a compreender a grandeza deste sacramento.
Em Cristo, nada está perdido.
Em Cristo, o amor permanece.
Em Cristo, a separação não é o fim. É um lugar onde Ele mesmo continua a agir.
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