Aborto espontâneo: o que fazer?

Esta página destina-se a orientações gerais sobre o aborto espontâneo.

A Pius Edições deverá lançar em breve um livro de orientações sobre aborto espontâneo. Como este tema é de grande relevância e a todo momento pais podem estar angustiados necessitando de mais informações acerca do tema, anteciparemos aqui trechos do livro, que já podem ser úteis a muitos casais.

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Aborto espontâneo: o que fazer?

Apresentação, por Marlon Derosa

Este material visa dar apoio espiritual, jurídico e prático à uma situação concreta que venham a passar, podendo ter mais subsídios para obter o corpo de seu filho, promover o funeral e viver o luto. Este também deve ser útil a sacerdotes, para que possam orientar seu rebanho nesta matéria. Dará apoio também a compreensão do tema do Batismo para estes casos, tanto o de intenção quanto o de emergência quando possível.

Falaremos sobre a regulamentação que garante o direito das famílias enterrarem seus bebês perdidos em abortos espontâneos, mesmo no caso de perda abaixo de 20 semanas, 500 g de peso fetal ou 25cm.

Nova regra para registro do nome do natimorto publicada em 2023

Esse avanço jurídico recente vem no sentido de melhor reconhecer a dignidade da pessoa humana no início da vida e ao encontro do direito da família. 

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) pelo Provimento 151 de 26 de setembro de 2023, estabeleceu que crianças natimortas podem ter registro de seu nome em cartório. Antes dessa alteração, o registro era obrigatório quando a criança nasce com vida e morre logo após o parto. A regulamentação agora visa reforçar que mesmo nascido morto, o registro é possível. É um direito dos pais que desejam realizar o registro.

Vejamos a nova regra, e depois nossa análise:

Art. 479-A. É direito dos pais atribuir, se quiserem, nome ao natimorto, devendo o registro ser realizado no Livro “C-Auxiliar”, com índice elaborado a partir dos nomes dos pais.
§ 1º Não será gerado Cadastro de Pessoa Física (CPF) ao natimorto.
§ 2º É assegurado aos pais o direito à averbação do nome no caso de registros de natimorto anteriormente lavrado sem essa informação.
§ 3º As regras para composição do nome do natimorto são as mesmas a serem observadas quando do registro de nascimento.

Art. 479-B. Se a criança, embora tenha nascido viva, morre por ocasião do parto, serão feitos, necessariamente na mesma serventia, dois assentos, o de nascimento e o de óbito, com os elementos cabíveis e remissões recíprocas.”

Consideramos o natimorto o bebê que nasce sem vida, tendo seu óbito ocorrido a qualquer momento até segundos ou minutos antes do parto. 

A regulamentação não estabelece idade gestacional, portanto, pode-se interpretar que isso se aplique a bebês antes de 20 semanas de gestação. Contudo, em alguns casos, especialmente na área médica, usa-se o termo natimorto para bebês após 20 semanas de gestação. Isso poderá gerar alguns entraves, caso o operador de saúde queira diferenciá-lo. 

Contudo, para fins de sepultamento, como vimos, o requisito não é o registro do nome, mas a Declaração de Óbito (DO), que a resolução Anvisa permite que seja emitida para fetos de qualquer idade gestacional ou peso, caso a família solicite. Essa mudança vem no sentido de permitir o registro do nome, sem CPF, o que pode ser feito em até 15 dias, portanto, após sepultamento.

Obstáculos na emissão da Declaração de Óbito

Com frequência tomamos conhecimento de casos em que algum funcionário de maternidade ou hospital cria obstáculos para emissão da Declaração de Óbito (DO) para fetos muito novos, abaixo de 20 semanas de gestação ou 500g de peso fetal.

Os casais com perdas de bebês após esses critérios dificilmente terão problemas para ter a DO emitida, já os que perdem bebê antes desta data, podem encontrar obstáculos.

Mas esses obstáculos são por desconhecimento dos funcionários do hospital acerca do que diz todas as normas acerca do tema, por isso, ter este material em mãos, em especial as páginas a seguir, poderão resolver o problema em muitos casos.

Abortos espontâneos e aspectos práticos para o funeral e enterro 

Aqui apresentamos de modo mais prático, os passos a serem dados em caso de perda de um bebê. 

Como vimos, o primeiro passo fundamental é a obtenção da Declaração de Óbito (DO). Aparentemente, este é o maior obstáculo nos casos de abortos precoces. Sem tal documento, os cemitérios não poderão fazer o enterro.

O processo de forma macro para sepultamento consiste em:

  1. Solicitar a emissão da (DO) Declaração de Óbito fetal. 
  2. Levar a DO a um cartório 
  3. Apresentar a DO na Central de Óbitos ou Funerária
  4. Funerária ou pai da criança realiza o transporte do corpo (há uma guia para isso normalmente fornecida no passo nº 3)
  5. Por fim, realizar o sepultamento no cemitério.

A seguir, trazemos uma explicação mais completa, do Padre Dr. Lodi, acerca do tema, sob o título “Sepultura de bebês”.

Projeto TOBIT

Antes de aprofundar as questões normativas, gostaríamos de divulgar o cartaz do projeto Tobit. 

Um cartaz simples e prático que pode ser afixado em unidades de saúde, para divulgação dos direitos dos pais e do bebê que sofre aborto espontâneo.

Este cartaz pode ser usado a vontade ou você pode fazer outros com conteúdo  similar, inspirado neste material.

Atenção: O cartaz modelo do Projeto Tobit está com o contato em branco, que pode ser preenchido com contato de um grupo pró-vida da região, capacitado para tal apoio. Caso não haja, avalie pertinência de se fazer um cartaz alternativo sem informações de contato.

Clique aqui para baixar o cartaz.

Regulamentações locais

Pode ser pertinente que vereadores, deputados e outras autoridades regulamentem a obrigatoriedade de afixação de algum cartaz deste tipo na rede de saúde, visando trabalhar a cultura e o modo de trabalho, visando dar harmonia da prática com as normas vigentes.

Sepultura para bebês

Por Pe. Luiz Carlos Lodi da Cruz

(Os corpos dos defuntos devem ser tratados com respeito – Cat. 2300)

Em 2019, a 1ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDFT) negou a uma mãe o direito de ser indenizada por ter o hospital incinerado o corpo de seu filho, morto por aborto espontâneo, sem o consentimento dela. O argumento usado foi o de que o bebê pesava “apenas” 182 gramas, peso este compatível com 19 semanas de vida. Com um tamanho e uma idade tão pequenos, o hospital não era obrigado a elaborar a Declaração de Óbito (DO), nem a devolver o corpo à mãe. Eis um trecho da ementa do acórdão:

DESCARTE DO FETO. POSSIBILIDADE. OBSERVÂNCIA À RESOLUÇÃO DO CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. DEVER DE INDENIZAR. IMPOSSIBILIDADE. SENTENÇA MANTIDA.

A recusa de lavrar a Declaração de Óbito e de devolver o corpo à mãe, baseada unicamente no tamanho, peso ou idade do bebê, parece enquadrar-se naquilo que o Papa Francisco tem chamado de “cultura do descartável”, que é mais um aspecto da “cultura da morte” denunciada pelo Papa São João Paulo II.

No entanto, ao contrário do que decidiu o TJDFT, há normas específicas respeitando o desejo dos pais de dar sepultura às suas crianças natimortas.

Que diz o direito?

A Lei de Registros Públicos (Lei 6015/1973) prevê o registro de bebês nascidos mortos (natimortos) e destina a eles um livro particular: o “C Auxiliar”:

Art. 33. Haverá, em cada cartório, os seguintes livros:
[…]V – “C Auxiliar” – de registro de natimortos;
Art. 53. No caso de ter a criança nascido morta ou no de ter morrido na ocasião do parto, será não obstante, feito o assento com os elementos que couberem e com remissão ao do óbito.
1º No caso de ter a criança nascido morta, será o registro feito no livro “C Auxiliar”, com os elementos que couberem.
[…]Art. 54. O assento do nascimento deverá conter:
[…]5º) a declaração de que nasceu morta, ou morreu no ato ou logo depois do parto;

Como se vê, a Lei não faz distinção de idade, peso ou tamanho das crianças natimortas cujo registro é obrigatório. Tal distinção foi feita pela Resolução nº 1.779/2005 do Conselho Federal de Medicina:

Art. 2º – Os médicos, quando do preenchimento da Declaração de Óbito, obedecerão às seguintes normas:

[…]

2) Morte fetal:

Em caso de morte fetal, os médicos que prestaram assistência à mãe ficam obrigados a fornecer a Declaração de Óbito quando a gestação tiver duração igual ou superior a 20 semanas ou o feto tiver peso corporal igual ou superior a 500 (quinhentos) gramas e/ou estatura igual ou superior a 25 cm.

No entanto, mesmo que o corpo da criança esteja abaixo dessas especificações, nem por isso o desejo dos pais é irrelevante. É o que se lê no manual de instruções para preenchimento da declaração de óbito, do Ministério da Saúde:

Quando não emitir a Declaração de Óbito

A DO não deve ser emitida nas seguintes condições:

  • Óbito fetal, se a gestação teve duração menor que 20 semanas E se o feto tiver peso corporal menor que 500 g E estatura menor que 25 cm:
    • apenas se a família requerer a DO, será facultada ao médico a emissão do documento para fins de sepultamento. Os dados dessa DO devem ser registrados no SIM [Sistema de Informações sobre Mortalidade].

Uma resolução da ANVISA (Resolução RDC Nº 306, de 2004), embora considere os cadáveres de tais crianças como “Resíduos de Serviços de Saúde” (RSS), leva em conta o caso em que os familiares fizerem a requisição deles.

7 – GRUPO A3

7.1 – Peças anatômicas (membros) do ser humano; produto de fecundação sem sinais vitais, com peso menor que 500 gramas ou estatura menor que 25 centímetros ou idade gestacional menor que 20 semanas, que não tenham valor científico ou legal e não tenha havido requisição pelo paciente ou seus familiares.

7.1.1 – Após o registro no local de geração, devem ser encaminhados para:

I – Sepultamento em cemitério, desde que haja autorização do órgão competente do Município, do Estado ou do Distrito Federal ou;

II – Tratamento térmico por incineração ou cremação, em equipamento devidamente licenciado para esse fim.

Daí se depreende que, mesmo em se tratando de natimortos abaixo dos parâmetros de idade, peso e comprimento:

  1. Não há previsão para o descarte quando tiver havido requisição deles por seus familiares (ao contrário do que decidiu o TJDFT).
  2. Mesmo que os familiares não tenham requisitado os cadáveres, é possível sepultá-los em cemitério, bastando autorização do órgão competente do Município, do Estado ou do Distrito Federal.

Conclusão

“Os corpos dos fieis defuntos devem ser tratados com respeito e caridade, na fé e na esperança da ressurreição. O enterro dos mortos é uma obra de misericórdia corporal que honra os filhos de Deus, templos do Espírito Santo” (Catecismo da Igreja Católica, n. 2300).

Convém ensinar aos pais que sofreram a dor da morte de um filho em gestação, que eles têm o direito de receber o corpo do bebê e de dar-lhe as honras fúnebres.

Ainda que a Resolução CFM n. 1.779/2005 fale da obrigação de emitir Declaração de Óbito de crianças natimortas “grandes”, não há proibição de emitir tal declaração para as crianças “pequenas”. E o desejo dos pais deve ser respeitado.

De posse da Declaração de Óbito, os pais podem, em conformidade com a Lei de Registros Públicos (art. 77), fazer o sepultamento da criança.

Obstáculos a vencer

A “cultura do descartável” marca sua presença nos ambientes hospitalares, mesmo em instituições católicas. É comum que os profissionais de saúde tentem convencer os pais a não requererem o corpo do bebê natimorto “pequeno”, alegando: 1) que o sepultamento daria um desnecessário trabalho extra; 2) e que seria conveniente enviar o cadáver para o laboratório a fim de submetê-lo a um exame anamatopatológico (de lá ele não voltará) para verificar a causa de sua morte.

Atualmente, os pais que querem sepultar seus bebês devem estar preparados para enfrentar uma forte oposição justamente por parte daqueles que mais deveriam ajudá-los: os médicos e os enfermeiros. Convém, portanto, investir na formação bioética destes últimos.